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Eros Volúsia (Heros Volúsia Machado- 1914/ 2004) foi uma dançarina brasileira nascida no Rio de Janeiro, aluna de Maria Olenewa na Escola de Bailados do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, hoje Escola Estadual Maria Olenewa. Estreou no Teatro Municipal e pouco depois podia ser considerada a inventora da dança brasileira. As danças místicas dos terreiros, os rituais indígenas, o samba, o frevo, o maxixe, o maracatu e o caboclinho de Pernambuco foram algumas das fontes de pesquisa artística da bailarina. Em uma de suas inúmeras entrevistas dadas à Revista O Cruzeiro, Eros Volúsia sintetizou sua missão artística: "Dei ao Brasil o que o Brasil não tinha, a sua dança clássica!"

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Dançologia Negra Carioca: Cia. Rubens Barbot Teatro de Dança 20 Anos

Completando duas décadas de luta e forte contribuição á produção cultural contemporânea brasileira, Cia Rubens Barbot Teatro de Dança comemora presenteando o público com o espetáculo ‘40+20’. E ainda  mostram como no século XXI a arte continua ressurgindo das cinzas vencendo um incêndio que acabou com todo o acervo histórico de material cênico utilizado por estes em sua trajetória artística, fundada em produções cinematográficas, coreográficas, performances e espetáculos – figurinos, adereços, cenários, cds, aparelho de som, maquinas de costura, tecidos.

E que também destruiu o material cenográfico concluído do novo trabalho ’40+20’, antecedida em quarenta dias de sua estréia, para outubro.
É com esta força e talento, em transformar o caos em material inspirador de sua dramaturgia, que a primeira companhia de dança contemporânea afro-brasileira delineia sua filosofia e história, dirigida pelo coreógrafo Rubens Barbot e pelo diretor de teatro, roteirista e produtor cultural Gatto Larsen, contando com a contribuição artística de Rubens Rocha, Elvio Assunção, Valéria Monã, Luis Monteiro e Claudia Ramalho, para conjuntamente escrevem nos anais da história da dança brasileira sobre o modo singular da produção cultural negra na contemporaneidade, a partir da cidade do Rio de Janeiro. ¹
Em 20 de agosto de 1990 é criada, em pleno cenário artístico nacional insosso e elitista principalmente pelo modo de tratar a cultura negra, o negro e seu potencial dramático, a Cia. Rubens Barbot Teatro de Dança², inaugurando um projeto que buscava refletir o homem negro de seu tempo, em gestos e pensamentos. A partir daí, este grupo de profissionais, irá delinear sua trajetória inteiramente atrelados ao desejo manifesto de dar asas ao "gesto honesto" do pensar, fazer e  produzir artetrazendo à boca de cena o negro e seu universo sócio-cultural, impregnado de mazelas, prazeres e inquietações singulares.
"Estamos cansados de ver o papel que está sendo dado á dança. Parece que pensam que a condição da dança é etérea, bela (no sentido „lindo‟ da palavra) e boba. Não podemos ignorar o meio onde criamos os movimentos dos homens de hoje, o caos deste final de século onde a poesia está na busca de dignidade (tão perdida na sujeira que nos rodeia), no amor escasso... É no meio de tudo isso, que procuramos um gesto honesto capaz de ser o elo de comunicação com o homem atual. Que remeta ao seu passado se for o caso, ativando sua memória corporal, mas que de uma forma ou outra, o atinja, o motive e possamos estabelecer uma comunicação. (...) estamos convencidos que, o que realmente une o homem ao seu antepassado são os gestos. A experimentação a procura do movimento do homem e seu gesto, sejam no trabalho, no amor, na dança, e necessidade de uma imagem atual, orientam o nosso projeto coreográfico. Por sobre tudo, um gesto honesto. ‟ ³
     Ao longo dos anos estes artistas se admitem "desorganizar" a cena contemporânea da dança brasileira, principalmente a carioca composta densamente de uma classe média de formação escolástica clássica e moderna, com forte influência européia e americana. Deste modo, sem pedir permissão eles arrombam a porta dos teatros e espaços alternativos adentrando, numa invasão sem propósito para muitos coreógrafos e bailarinos desinformados,  á cena carioca apresentando sua estética através da criação de performances que fogem de um padrão. Debruçada sobre forte corporalidade e simbolismos cultural,  heranças fundadoras de uma das maiores diásporas fora da África negra, estes artistas se retroalimentam na contemporaneidade destas fontes, nas dimensões do sagrado e profano, para compor através de performances e espetáculos, um resgate de gestos, movimentos e imagens, que potencializam sua identidade, como as de quem os assiste. 
      Assim, refletindo a si mesmos em suas construções, a Cia vai iluminando a marginal geografia cultural negra na urbanidade carioca, expondo através de uma coletânea de imagens que não contam necessariamente uma história, os resultados desta etnografia gestual peculiar a cidade, seus habitantes, como  sobre a relação que os que vivem nela estabelecem com  o entorno e consigo mesmo. 
     Para o antropólogo Júlio C. Tavares, o trabalho coreográfico de  Rubens Barbot sos afirmam positivamente a memória corporal do negro afro-brasileiro, em estética e temática, subvertendo a condição deste corpo falante em pensante, onde o gesto comum diário converte-se em movimento intensamente expressivo, decisivo no embate contra o bestialismo colonial na dança. E prossegue afirmando que:
"(...) [O] projeto coreográfico é profundamente audacioso, pois é de natureza cognitiva quando empreende, no país do racismo cordial, um questionamento ao corpo colonizado e ao espaço da dança como lugares da hegemonia racial. Reside aí o ponto mais audacioso do seu projeto, que é pensar os corpos afro-brasileiros e as posturas bestializadas pelo colonialismo cognitivo através da arte do movimento e da estética da dança. Ao invadir o palco, Barbot silenciosamente promove um ataque contra-hegemônico no plano cultural (como o dos rappers na indústria fonográfica [americana]). Ele ocupa um dos lugares sacralizados pelos apelos às imagens ególatras e narcíseas do corpo branco, colonialista e racista na sua permanente negação ao corpo negro. ‟ 
    
Deste modo a companhia, em sua dançologia vem descolonizando culturalmente a dança brasileira, apresentando estéticas e culturas outras intermediado principalmente pelas obras: “Em pleno meio dia de nossa noite” (1997); ‟Toque de Dança‟ (1996)"Três Estudos Coreográficos” (1992); "Dança Naná” (1993)“Suspeito Silêncio” (1990)  e “O Reino de Outro Mundo” (2008), os quais conjuntamente alcançam á passos largos o reconhecimento histórico na escrita da arte dança brasileira, culturalmente  multicolorida.
"Esses longos e prazerosos [20] anos, tidos como extensos quando se trata da sobrevida de uma companhia de dança, ainda mais uma companhia assumidamente off, são resultantes de várias obras de sucesso, passagens por vários lugares do Brasil e do mundo, muito trabalho social, aplausos de críticos internacionais e nacionais, salvo alguns poucos antagônicos, que com desprezo, problematizam nossa pesquisa e a denominam somente “pesquisa desorganizada”,  desconhecendo o movimento simbólico do eterno desorganizar para o se organizar de novo, como se no Brasil não vivêssemos também essa odisseia insana.‟ ¹¹
     Por fim, desejamos uma vida longa á emblemática dançologia¹² negra em busca “por um gesto honesto” impressa na valorização do saber corporal cultural destes artistas, “desorganizadores de fichário" de ontem e de hoje na dança brasileira! 

Por Claudia Ramalho – RJ
Mestre em Ciência da Arte (UFF); Preparadora corporal e Intérprete-criadora das Cia. Rubens Barbot Teatro de Dança (desde 2001) e Cia. Arquitetura do Movimento (desde 2007).
Email: cacauramalho@yahoo.com.br

Notas
¹ SIQUEIRA, Denise C. O. “Corpo, comunicação e cultura: a dança contemporânea em cena”. Campinas, SP: Autores Associados, 2006.
² RAMALHO, Claudia R. G. “Dança Afro-brasileira Contemporânea” - Módulo IV: Corporeidade e Performance Afro-brasileira‟. Apostila 7: Pós-graduação „Estudos Culturais e Históricos da Diáspora e Civilização Africana’. Macaé: FUNEMAC/ FEMASS, 2007.
³ RAMALHO, Claudia R. G. “Dança Carioca: Por um gesto honesto”. (Mestrado em Ciência da Arte) – Instituto de Arte e Comunicação Social da UFF. Niterói, 2006.
 Barbot In: RAMALHO, Claudia R. Gomes e MEIRELLES, Daniela. “Inédito na Dança: Busca ou Acaso?”. (MCC Licenciatura em Educação Física) – EEFD/UFRJ - Fundão, RJ, 2001.(Pg. 43 )
 TAVARES, Júlio C.. “Subversão Somática”. Nova York: 2000. (Artigo)
 Selecionado para representar o Brasil, em turnê na Alemanha: Munique e Frankfurt, onde Barbot é reconhecido pelos críticos como „O Mago da Dança‟ brasileira; (RAMALHO, 2006: pgs. 103 e 104).
 ‟Toque de Dança: suíte para percussão e corpos‟ (1996), destaque na 7º Bienal de Lyon (FR) (RAMALHO, 2006: pgs. 102 e 103).
 Reconhecida melhores obras no Festival Internacional „Danza Libre‟ - (ARG), também ganhando o troféu “MITIZI SIRGEZA” de melhor Companhia. (RAMALHO, 2006: pgs. 100 e 101).
 Primeira obra do grupo sendo composta por 3 atos, abordado "Imagens Urbanas", "Imagens Emocionais'; e „Imagens Apocalípticas' - 'Suspeito Silêncio'. Intérpretes-criadores - Rubens Rocha, Luiz Monteiro e Sérgio Menezes.
¹ Informação do site oficial da companhia - http://ciarubensbarbotteatrodedanca.blogspot.com
¹¹ Idem
¹² RAMALHO, Claudia R. G.. “Performance do Samba: Uma dançologia em processo”. Artigo publicado no site: www.portalabrace.org Ver também “Performance do Samba: Por uma Dançologia do Samba Carioca”. (enap2010.wordpress.com).